Ética no Jornalismo (II)

Com experiência como jornalista da mídia tradicional e durante anos (do outro lado do balcão) como assessor de imprensa, posso atestar que nesta, a grande imprensa, ética nunca foi um princípio. Basta ler os códigos de ética das Organizações Globo ou da Folha de São Paulo e comparar com o que eles divulgam e a forma como  o fazem, para entender que o conceito de Ética de seus proprietários é bem elástico. O que é até compreensível, porque o jornalismo é um negócio como outro qualquer, com o objetivo de auferir lucro para seus donos.

E o negócio, na imprensa brasileira, sempre foi valorizar o poder econômico e seus capachos governamentais (que distribuem as altíssimas verbas publicitárias que garantem a sobrevivência de jornais, rádios e tevês) e travar qualquer possibilidade de eleger-se governos que possam ameaçar esta fonte de recursos. Em 15 anos de chefia da área de comunicação da CIBRAZEM, eu tenho  uma coleção de ‘cantadas’ de representantes da grande imprensa – Manchete, Visão, Veja, IstoÉ, O Globo, Jornal do Brasil, Correio Braziliense, Estado de Minas, Zero Hora, O Povo… rádios e tevês, que prometiam matérias elogiosas desde que a empresa neles anunciasse.

O mais terrível disto é que o jornalismo é essencial para a sobrevivência de uma democracia. Não o jornalismo praticado no Brasil (ou em outros países ditos democráticos, como Argentina, México, Rússia, Índia, por exemplos), onde a mídia é praticamente monopolizada por um grande grupo, que se espraia por todos os setores de comunicação, tornando a opinião de seus donos hegemônica, sem direito ao contraditório, a não ser aquele que eles próprios consentem.

Neste momento, por exemplo, o jogo jogado pela grande imprensa, Globo à frente, é óbvio para quem acompanha a política (o que não é o caso do povão, que não tem tempo para isto, tentando se segurar num emprego terceirizado ou procurando qualquer emprego ou vendendo pano de prato ou frutas nos sinais de trânsito): “Lula não pode ser candidato pois se for, ganha! Com um poste é mais fácil derrotar o PT mas, mesmo assim, vamos acabar com o PT também!”

É só ler as manchetes dos jornalões – as que ficam expostas em bancas de revistas que parte do povão costuma ler enquanto espera ônibus, para entender:  após a decisão do TSE não homologando  a candidatura de Lula (decisão que cabe recurso), mas permitindo a campanha eleitoral do PT, a Folha de São Paulo afirmou que “PT desafia TSE e mantém Lula como candidato“; O Globo, que “PT transforma horário eleitoral em programa ‘Lula livre’, e o Estado de São Paulo que “Após decisão do TSE, PT insiste em Lula e afronta Judiciário na TV e nas ruas.

Evidentemente, se a gente for pesquisar os demais  jornais regionais e emissoras de rádio e tevê, a linha noticiosa é a mesma, com raras e honrosas exceções. Com isso, ao mesmo tempo que se esconde um fato (a possibilidade de recurso), tal noticiário exerce uma pressão irresistível sobre determinados membros das instituições públicas, muito sensíveis à opinião publicada (principalmente de um Jornal Nacional), o que os leva a tomar decisões que atendam os interesses dos donos da mídia e do poder.

Um jornalismo ético mostraria que existem divergências claras na interpretação da lei, no enfoque usado pelo relator Barroso e seguido por outros 05 juízes, no qual foi negado ou omitido o posicionamento do Comitê dos Direitos Humanos da ONU, aliás bem enfatizado pelo ministro Luiz Facchin, relator da Lava Jato e, surpreendentemente, o único voto favorável à elegibilidade de Lula, mesmo que ‘temporariamente’.

Isto fica evidente se a gente esquece a grande imprensa e vai se informar através de blogs e sites independentes: o contraditório é visível! Há, claro, aqueles que descem o cacete na estratégia petista de manter o Lula candidato e querem a proibição dos programas eleitorais petistas, ‘por desobediência ao TSE’, e há aqueles que descem o cacete nos juízes do TSE, incentivando o PT a afrontar a Corte, divulgando programas com Lula Livre… E há, também, os que praticam um jornalismo ético, geralmente antigos jornalistas que se afastaram da mídia tradicional exatamente porque praticam a Ética no Jornalismo.

Mas ninguém consegue comprar arroz e feijão expondo suas ideias e opiniões, a não ser que seja professor contratado, consultor ou conferencista. Manter blogs e sites custa dinheiro, a exemplo da grande imprensa.  E o capitalismo brasileiro continua sendo selvagem! É praticamente impossível encontrar um grande empresário, um  investidor, um executivo de multinacional, um membro de corporação estatal disposto a transformar o país numa democracia estável, com instituições dedicadas a olhar toda a população como  igual.

O ditado é antigo, mas continua retratando fielmente os poderes institucional, político e empresarial brasileiros: farinha pouca, meu pirão primeiro! A ideia central é uma só: “se eu posso viver em Paris, Nova Iorque ou Dubai, com a riqueza auferida no Brasil, porque me preocupar com o povão? Ou, se eu posso receber auxílios extra salariais sem pagar imposto de renda, porque eu vou incorporá-los ao salário, que tem pesado desconto de imposto de renda? E, infelizmente, grande parte da população brasileira continua passiva, demonstrando uma indignação bovinamente acomodada, como sempre foram seus colonizadores portugueses.

Neste contexto, qual o interesse do andar de cima em manter uma imprensa ética? Os portugueses, um dia, mandaram a passividade para a p…* que os pariu e fizeram a Revolução dos Cravos. E nós, vamos ter este gostinho algum dia?

Eu gostaria (talvez seja uma torcida inglória) que as próximas eleições demonstrassem, claramente, que a grande imprensa, Jornal Nacional principalmente, deixou de ser influenciadora massiva de opinião, especialmente da classe média, que continua acreditando que as novelas são calcadas na realidade do país. E que os telejornais são uma continuidade das novelas… E que as redes sociais estão ganhando a batalha da comunicação. A proliferação das opiniões, a manifestação, pacífica ou raivosa, das pessoas, satisfeitas ou p…s* com determinadas situações do país é a realização efetiva da democracia popular e plural, algo que a política partidária e congressual deixou de ser há bastante tempo.

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