Cadê o fundo, meu deus! (II)

É bem verdade que os membros da Polícia Federal, da Procuradoria Geral da República e de outros órgãos de controle de governos passaram a arrotar importância e exigir e conquistar certas regalias inaccessíveis à maioria dos brasileiros após a ascensão de Lula Presidência, que ampliou os recursos e poderes destas instituições, consideradas de controle, além de criar outras, como a Controladoria Geral da República. Talvez por isto, aliás, por achar que seria considerado um benfeitor destes profissionais, ele imaginou que iria ter a eterna gratidão deles e que nunca seria perseguido tão implacavelmente como vem sendo.  Advindo da camada mais pobre e trabalhadora do país, onde gratidão e solidariedade são basilares para a sobrevivência no dia a dia, ele não se deu conta que o brasileiro, em geral, não pode subir num banquinho mais alto, que passa a se achar o bom, o dono da bola, por cima da carne seca, único responsável pela sua própria ascensão na vida.

Já os juízes, não! Eles sempre estiveram acima da patuleia, a massa inculta e passiva que forma a imensa população brasileira (assim como os médicos e, atualmente, os jornalistas). Não é atoa que, além do salário equivalente a 20/30 vezes o salário mínimo do país e dos penduricalhos, eufemisticamente chamados de auxílios, eles têm um direito quase único na legislação brasileira: 88 dias de férias ao ano…!

Melhor que isto só os políticos de todos os matizes, que costumam “bater ponto” 03 dias por semana, 12 dias por mês, 144 dias por ano… Mas com uma diferença básica: político tem que ser eleito, juiz não… faz concurso, como procurador, policial e demais funcionários do Estado. Ou seja: político pode ser “demitido” a cada eleição… os demais só se forem condenados por pisarem na jaca, o que é muito difícil de acontecer. Pisarem na jaca, não, até que é comum, mas serem condenados por isto… Aliás, a pena máxima que juízes recebem, caso condenados não é bem uma pena… é um agradecimento da população  aos “bons serviços prestados com tanto sacrifício…!”

Estas benevolências do Estado brasileiro para o Judiciário não são culpa de Lula… Foram sendo incorporadas ao longo do tempo à legislação brasileira, o que se explica por uma característica expressiva do brasileiro, o corporativismo (que não deixa de ser irmão gêmeo da gratidão e da solidariedade): afinal de contas, dos 34 presidentes da República que tivemos, 19 eram bacharéis em direito. Mas, também se teve muitos “afagos” durante  a ditadura militar… que tinha uma estratégia por trás disto: o regime imposto em 1964 precisava ser referendado pelas nações democráticas. E, para isto, um arremedo de democracia era imprescindível. Nada melhor que um Congresso aberto e uma Justiça operante, compostos por homens espertos e cooperantes… (com as exceções de praxe!)

E é assim que neste buraco sem fundo de um país em que grande parte da população acha que o inimigo a ser combatido, chutado, apedrejado… morto até, é o torcedor do outro time e não quem ganha 30, 50, 100 vezes mais do que ele, uma tchurma solidária e grata que, do  mesmo modo que as torcidas,  toma as dores dos companheiros e lança mão de todas as armas para defendê-los, se possível dentro da lei, que esta eles manejam bem.

É o caso do poderoso Tribunal de Justiça de São Paulo. Quando da posse de seu atual presidente, na entrevista aos jornais, perguntado sobre o auxílio-moradia, ele disse, ironicamente: “Eu acho muito pouco. É isso que você (repórter) queria ouvir? Agora, coloca lá: ‘o desembargador disse que é muito pouco’”.

O repórter colocou e a resposta foi alvo de comentários críticos na imprensa em geral e de gozações e ironias mil nas redes sociais, inclusive no grupo interno dos próprios funcionários do Tribunal. Agora, o Globo noticia que  “O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) abriu uma sindicância para investigar a conduta de funcionários que criticaram, em redes sociais, o auxílio-moradia pago a magistrados…  A investigação pode resultar na abertura de um processo administrativo, e as punições podem variar de advertências brandas à suspensão temporária do cargo sem recebimento de salário.”

           

Isto, na augusta visão de Suas Excelências, não é censura… é zelo pela respeitabilidade de Suas Excelências! Interessante observar que um dos comentários postados no Facebook dos funcionários do TJ-SP, “batizado como Bloco dos Togados”, trazia  a letra parodiada da marchinha “Me dá um dinheiro aí”, dizendo: ‘Ei, você aí, me dá um auxílio aí, me dá um auxílio aí. Não vai dar? Não dar não? Vou lhe prender só por convicção”.

Esta marchinha, sucesso de Moacyr Franco de 1959 é considerada uma das 10 mais do Carnaval brasileiro, com a seguinte letra original:

Para alívio de todos aqueles que apreciam a alegria de viver e pularam muitos carnavais ao longo da vida, cantando esta marchinha também, ela foi lançada no governo JK. Se fosse hoje, provavelmente a tchurma do MBL e do Vam Pra Rua e os bolsominions estariam tentando proibi-la por “incentivar a vagabundagem e o consumo de bebidas alcoólicas..”.

Enfim, do jeito que a coisa vai, é como dizia meu professor de Português no Colégio Estadual, nos anos da ditadura militar: “Nós estamos intussusceptados e mal remunerados…

 

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