Cadê o fundo, meu deus! (I)

Está ficando chato e repetitivo, mas a verdade é que no Brasil de hoje não se chega ao fundo do poço e, a cada dia, semana ou mês, o fundo afunda mais. Porque a realidade e suas  verdades fáticas só aparecem quando os cachorros grandes começam a disputar quem assume o poder… E quando eu digo poder, neste caso, não significa necessariamente dinheiro, riqueza, o poder transformado em bens que derrubam o queixo e provocam a inveja do populacho ou em dólares, euros, ouro, bitcoins bem guardados em cofres suíços ou, até, gastos com personal trainers contratados em Miami…

Poder, neste caso, significa ser o menino (ou menina) de turma que todos nós fomos um dia e que, perna de pau mas dono da bola, mandávamos: “Ou eu jogo na linha ou eu levo a bola embora (substituam a bola pela boneca que ria, chorava e tinha guarda-roupa e eu não estarei sendo machista…!).

Eu fiz Jornalismo em plena vigência da ditadura. Quando fiz “vestibular” (na época não era único), os “vestibulandos”, na hora da inscrição, tinham que preencher uma ficha com dados pessoais, o que é óbvio, mas que tinha uma pergunta adicional: “Por quê você escolheu esta profissão?” Não me lembro o que escrevi (na época, eu estava mais preocupado em justificar para meu pai porque não tinha escolhido Medicina), mas devo ter escrito algo como “eu gosto de escrever… meu sonho é ser escritor… ou qualquer coisa neste sentido).

Anos depois, fiquei sabendo que esta pergunta não tinha qualquer relação com alguma  pesquisa ou estudo da própria Faculdade para medir alguma coisa relativa à consciência dos futuros alunos quanto a profissão escolhida… Era uma pergunta introduzida por prepostos do regime militar com o objetivo de verificar a “índole política” ou até o grau de politização destes futuros universitários, informações bastante úteis para os órgãos de segurança e informação da ditadura.

Ou seja: os donos da bola naqueles tempos sombrios eram os militares, E, como bons estrategistas, já se preparavam para enfrentar os possíveis “inimigos” do futuro. Fizeram isto durante algum tempo e conseguiram se manter no poder por 21 anos, coisa que o PMDB de Sarney, o PSDB de FHC e o PT de Lula, democraticamente, não conseguiram.

Os donos da bola agora, são outros: os altos funcionários do Estado, gente que ganha 20, 30 vezes mais que o salário mínimo, gente que dispõe de penduricalhos legais além destes salários, gente que tem certeza que as leis não foram feitas para eles pois, por terem sido feitas por eles, elas servem a eles, assim como todo o resto do país.

 

Não é atoa que juízes se acham no direito de receber auxílio moradia em dobro (ele e a mulher), apesar de já terem residência própria na cidade onde atuam… Não é atoa que procuradores se acham no direito de receber diárias para atuarem em outra cidade, mesmo sabendo-se que esposa e filhos moram nesta outra cidade… Não é atoa que delegados se sentem no direito de convocar 100 policiais de outros Estados, com diária e hospedagem paga pelo Estado (por nós) para fazer a apreensão de meia dúzia de professores universitários… Não é atoa que juízes supremos joguem no lixo uma cláusula pétrea da Constituição, a presunção de inocência até o trânsito em julgado, para impedir que Lula seja candidato à Presidência da República.  (continua)

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *