O dia em que o governador pousou lá em casa e tropicou na minha grama! (III)

Retornando aos fatos e tentando,  a muito custo,  manter a isenção

Querendo equilibrar a desinformação (proposital?) oficial com as certezas declaradas (propositais?) pela Imprensa, a associação representativa da região solicitou a interveniência  da Comissão de Meio Ambiente da Câmara Distrital de Brasília que, prontamente, marcou uma reunião ordinária – com a presença de três de seus nobres deputados distritais – na sede da associação, no dia 19 de outubro. Ouvida a comunidade, tomou ela algumas deliberações, a principal delas a convocação de uma audiência pública para o dia seguinte, 20 de outubro, quando seriam convocadas todas as autoridades envolvidas no problema – secretários, dirigentes de agências e empresas governamentais, além de especialistas da área – para darem explicações cabais à comunidade.

No dia seguinte, a autoridade máxima apareceu primeiro, ainda cedo  – ler próximo sub título – e os três deputados, Chico Floresta, Augusto Carvalho e Eliane Pedrosa, se fizeram acompanhar, à noite, do secretário e da subsecretária do Meio Ambiente e da diretora da Divisão de Vigilância Ambiental da Secretaria de Saúde para a tal audiência pública, a que compareceram cerca de 200 moradores da região.

Por melhores que fossem as intenções dos parlamentares, os resultados foram pífios, especialmente porque não havia técnicos ou especialistas presentes. Poucas explicações convincentes, muito diz-que-diz-que, algumas demonstrações de incompetência explícita e as questões principais não respondidas: cadê os laudos mostrando a contaminação? Há, realmente, benzeno no lençol freático de toda a região? se há,  qual é a origem? No fim, apenas uma definição: os oito poços sob suspeita seriam alvo de novos exames – anteriormente negados – dentro das técnicas recomendadas por um especialista da Petrobras, oficialmente convocado para opinar mas, àquela altura, já longe de Brasília.

(Outra observação pertinente: este especialista da Petrobras apareceu na mídia repentinamente; o GDF contratara um “especialista da Petrobras” para analisar a situação dos poços profundos da região – será que esperavam encontrar petróleo por lá?  Mas, do mesmo jeito que ele apareceu na mídia, sumiu. Aqui da planície, nós deduzimos que ele não encontrou nada interessante, recebeu seu cachê e se mandou, mas deixou uma cartilha com instruções com as devidas técnicas recomendadas…)

No sábado, 24 de outubro, o compromisso foi cumprido, pelo menos em parte: em minha chácara, técnicos de três laboratórios, incluindo o da UnB, que fizera o primeiro exame, positivo – e cujo laudo me foi entregue nesta ocasião – retiraram amostras de água do poço – que havia sido esgotado por um período de 45 minutos e, desde então, ficara sem a bomba –  no mesmo momento e com a mesma técnica, despejaram em vidros idênticos, que colocaram em isopores com gelo, para encaminhar aos respectivos laboratórios.

Soube-se posteriormente, mas não oficialmente, já que os laudos nunca foram entregues aos usuários das chácaras, que 02 (dois) laboratórios apresentaram resultados negativos, enquanto que outro apresentou resultado positivo, muito menor que o anterior para todas as amostras colhidas.

Muitos moradores da região por sua vez – cerca de 70 – contrataram, através da associação, um laboratório da USP de São Carlos/SP para fazer a avaliação da água, cujos resultados, para todas as amostras analisadas, inclusive as do meu poço, apresentaram ausência absoluta de benzeno na água.

Para encerrar com chave de ouro, o secretário do Meio Ambiente, em coletiva à Imprensa no dia 02 de novembro, ironicamente dia de Finados, declarou que as águas de todos o poços da região, inclusive as do meu, estavam definitivamente liberadas para todos os usos – beber, tomar banho, cozinhar, regar plantas e molhar verduras e frutas – cabendo à Secretaria, apenas, a partir de então, fazer o monitoramento dos poços entre as Ruas 06 e 09, próximos à Escola, vez que a contaminação detectada não mais existia… mas existira!!!

Passados já alguns anos, não é do conhecimento da comunidade que os responsáveis pela obra de impermeabilização da caixa d’água da escola fundamental da região – e de várias outras em todo o Distrito Federal – tenham sido convocados para explicações. Afinal de contas, são escolas públicas… e quem estuda nelas é o povão! Para que se preocupar?

Enfim, o pouso do governador lá em casa, uma farsa: a fala de Sua Excelência ao povo e um espetáculo sem povo, o tropicão!

            Na quinta-feira, 20 de outubro, o governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz, cumpriu a promessa de seus assessores e foi à região conversar com seus moradores. Na noite anterior, seus assessores haviam ligado para o presidente da associação, informando-o da presença de Sua Excelência e solicitando que a comunidade estivesse presente, pois era desejo dele, governador, falar diretamente com o povo.

À espera de Sua Excelência

Ele chegou de helicóptero, desceu numa chácara vizinha ao local da concentração – por exigências técnicas, detalhadamente verificadas no dia anterior, a minha – e sem se dignar a cumprimentar o proprietário, eu, dirigiu-se apressadamente à  sede da associação, onde foi cercado por assessores, políticos, dirigentes de agências e empresas governamentais e seguranças, que o levaram para o salão de reuniões, à qual foi impedido de entrar o presidente da associação, dono da casa e representante maior da comunidade.

Uma hora e quarenta minutos depois, Sua Excelência saiu e, com um papel na mão e o microfone na outra, leu as cinco – que viraram sete – medidas tomadas “junto à comunidade”, para enfrentar aquele que era “o maior problema de meu governo neste momento!”:

  1. A CAESB vai garantir água potável e gratuita para todos os moradores da região que a quiserem;
  2. Exames para detecção de benzeno serão feitos em toda a população da região, mesmo não tendo sido constatado, nos exames feitos até agora, qualquer intoxicação aguda; os resultados dos exames, a partir de agora, serão divulgados de 24 em 24 horas.;
  3. Mandamos interditar um poço profundo, o da Escola, e outros sete serão interditados ainda hoje;
  4. Todos os poços profundos da região – 327 – serão examinados;
  5. Dr. Valmor, da Petrobras, maior especialista em benzeno do país, virá a Brasília, para acompanhar os trabalhos realizados pelos técnicos de nossa Secretaria;
  6. O secretário do Meio Ambiente, dr. Antônio Gomes, responsável direto pelas ações do governo aqui na região, despachará diretamente da associação, a partir de agora; e
  7. A Escola voltará a funcionar normalmente amanhã.

Lidas as medidas “discutidas com a comunidade”, Sua Excelência, cercada por assessores, políticos, dirigentes de agências e empresas governamentais e seguranças, entrou em seu carro preto e retornou para minha chácara, onde, infelizmente, teve que ficar esperando algum tempo, até eu passar pela comitiva e abrir o portão para ele.    Estava tão p…* pela demora em chegar ao helicóptero que desceu do carro preto antes dele parar e saiu sem perceber que o gramado era meio irregular, ou seja, tropicou num montinho mais elevado e só não se estabacou no chão porque assessores, políticos, dirigentes de agências e empresas governamentais e seguranças estenderam braços ávidos e o agarraram a tempo, ajudando-o a embarcar no helicóptero.

Durante a leitura das medidas – das quais apenas a 1 (durante os dois meses seguintes), a 6 (durante a semana seguinte) e a 7 (que voltou a funcionar no dia seguinte) foram cumpridas (???) – interrompida por gritos e vaias, o governador levantava os braços, abria largos sorrisos, interrompia o discurso e dizia: “calma, gente, calma, meu povo…” E, reduzido o burburinho, retomava a leitura, impavidamente.

Estas cenas – o governador de braços levantados e sorrindo para o povo – foram devidamente registradas pelas câmeras televisivas, posteriormente veiculadas pelos telejornais locais, com “informações” e declarações de autoridades públicas mostrando a eficácia da ação governamental.

Minha mãe, do alto de seus 86 anos à época que, pela atividade de meu pai, médico sanitarista que trabalhou e dirigiu colônias de leprosos no Piauí, Amazonas, Goiás e Minas Gerais, teve oportunidade de conhecer e conviver com políticos de toda estirpe – Virgílios, Veras, Ludovicos, Bias, Magalhães, Juscelino – após assistir um DF TV 2ª edição, me ligou e perguntou: “O Roriz está rindo de quê, meu filho?”

Então, eu não soube responder… Hoje, 12 anos depois, do alto de seus 98 anos, absolutamente lúcida após viver pelo menos 10 anos consumindo, cozinhando, tomando banho e regando suas plantas com a água do meu poço, sem qualquer problema, se ela repetisse a pergunta, eu mostraria a foto acima para ela  e diria: “agora, eu sei: “De nós, mãe, de nós…!”  (fim)

 

Um comentário em “O dia em que o governador pousou lá em casa e tropicou na minha grama! (III)

  1. Caro Leo,

    A razão de não ter recebido o presidente da Asproeste, depois relatada pelo chefe do cerimonial, foi de se pensar que o referido presidente era um dos fundadores do PT, confundindo-o com o vice-presidente. Um fato muito engraçado no dia é que o Bezerra, dono da Agropecuária Bezerra, quando viu o governador chegar, perguntou, ao mesmo ” governador o que o Sr. veio fazer aqui?” a resposta foi mais engraçada ainda: “não sei…. vou perguntar aos meus assessores”. Abs,

    Djalma

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