Do que têm medo nossos supremos juízes? (I)

Semana passada, o ministro Fachin, responsável pela Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, deu uma declaração inusitada para um reconhecido defensor dos procuradores da Operação. Afirmando que o país vive uma recessão democrática, disse que a candidatura de Lula em 2018, vetada pelo Tribunal Superior Eleitoral, teria feito bem à democracia e fortalecido o império da lei.

Mais surpreendente fica a afirmação porque noutro processo em julgamento no STF, que acusa o então juiz Sérgio Moro de parcialidade em relação à Lula, Fachin já votou contra o ex presidente. E foi justamente este julgamento parcial de Moro que não permitiu a candidatura de Lula em 2018.

Luiz Edson Facchin, filho de pequenos agricultores do Rio Grande do Sul, que construiu sua fama de doutor da lei no Paraná, foi indicado para o STF por Dilma Roussef, com apoio do MST, certamente porque, independente de sua reputação jurídica, tinha posições progressistas, sendo defensor da reforma agrária e do  casamento entre pessoas do mesmo sexo, inaceitáveis para ruralistas e evangélicos, opositores da presidenta, que não dava qualquer pelota pra eles.

Assumindo a Suprema Corte, Facchin, aparentemente, mudou de lado, e fez de tudo para empalmar a relatoria da Lava Jato no lugar de Teori Zavascki, morto num acidente de avião, meio esquisito até hoje. Tornou-se um ferrenho defensor da Operação, validando todas as suas ações, o que foi intensamente comemorado por Deltan Dallagnol, como mostra uma conversa divulgada pela Vaza Jato, depois de um encontro entre eles (Uh hu! O Facchin é nosso!).

Muitas foram as teorias conspiratórias criadas pra explicar esta mudança de posição, desde a existência de erros grosseiros cometidos em julgamentos passados até a possibilidade de chantagem por conduta pessoal reprovável, com direito a dossiê fotográfico.

Ninguém se lembrou, talvez pelo alto patamar dos supremos, das mais comuns  motivações humanas, o despeito e a vingança. Afinal, Fachin já havia sido cotado para o STF, desde 2003, por seis vezes, sendo preterido em todas elas por um torneiro mecânico sem instrução superior que ocupava a Presidência da República.

Também semana passada, o ministro Fux decidiu suspender os efeitos da única punição sofrida por Deltan Dallagnol nas mais de 20 representações contra ele existentes no CNMP. Em novembro, o coordenador da Lava Jato fora advertido por ter feito críticas ao STF e a suspensão desta advertência impede que a punição possa ser considerada como agravante em caso de outras punições ao procurador.

Mas, no caso de Luiz Fux, sempre a balouçar seu topete a la Elvis, a decisão não é inusitada. Ligado ao poderoso e fechado grupo judicial do Rio de Janeiro e apadrinhado pelo então governador Sérgio Cabral, também foi indicado por Dilma Roussef – outra prova de sua incompetência política. Depois de devidamente assentado na cadeira suprema, ficaram famosas suas andanças pelos corredores do poder petista em busca da indicação, incluindo um encontro com o ainda todo poderoso Zé Dirceu, quando disse que não haveria qualquer problema com o mensalão, que “ele mataria no peito”. Não matou.

O apoio de Fux à Lava Jato também ficou explícito noutro vazamento publicado pelo Th Intercept, a partir de conversas de Deltan Dallagnol com seus parceiros e com Sérgio Moro. Desta vez, a expressão mais significativa ficou por conta do então juiz que, ao ser informado pelo procurador, de uma conversa com Fux, respondeu que era excelente e exclamou: “In Fux we trust!”.  Alguma razão para tão significativa demonstração de confiança de Moro? Ou a Lava Jato já tinha, àquela época, o arquivo de 350 terabyes e dados de 38 mil pessoas? E Fux era uma delas?

Por último, mas não por fim, também semana passada, Celso de Mello, o decano que se aposenta em novembro, suspendeu o julgamento de Dallagnol em dois processos movidos pelos senadores Renan Calheiros e Kátia Abreu, que o acusavam de parcialidade na condução da Operação Lava Jato, além de tentativas de interferência no processo político brasileiro.

José Celso de Mello Filho é o mais antigo juiz da Suprema Corte, indicado pelo presidente Sarney, a pedido de seu ministro da Justiça, Saulo Ramos, de quem fora Secretário Geral na Consultoria Geral da República. Muito considerado pelos demais juízes, seja pela antiguidade, seja pelos intermináveis votos que , cheios de citações e daquele latinório ininteligível pras pessoas comuns, costuma ser, também, o mais imprevisível em seus julgamentos, podendo ser ovacionado ou vaiado tanto pela esquerda quanto pela direita, o que não significa dizer que ele seja objetivamente imparcial e justo.

Seu padrinho no STF, por exemplo, conta uma história dele em sua auto-biografia que não é nem um pouco lisonjeira, numa votação relativa à validade da candidatura do ex presidente Sarney ao Senado do Amapá e não do Maranhão, sua terra natal. Concordando com a tese da defesa, Celso de Mello era voto certo a favor de Sarney, mas votou contra. As justificativas para o voto foram tão ridículas que Saulo Ramos encerrou a conversa com ele dizendo: “Entendi que você é um juiz de merda!” (termina sexta)

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