Um homem de bem (I)

Hector Garrastazu dos Santos é seu nome. Hector em homenagem ao homérico guerreiro troiano, e Garrastazu em homenagem ao general Emílio Medici, o grande general presidente dos tempos em que o Brasil ia pra frente, “com paz, prosperidade e preno (sic) emprego”, como se vangloria o presidente atual, em uma de suas falas para militares.

O pai de Hector, um tenente que fora para a reserva como capitão, era um entusiasta de guerras e ditaduras e, como Hector nascera em 30 de outubro de 1969, dia em que o terceiro general assumiu a presidência, inaugurando o período mais brutal da ditadura brasileira, não teve dúvidas que nome daria ao menino

Hector cresceu no interior de Minas, sendo preparado, desde pequenininho, para servir ao Exército. O sonho de seu pai era vê-lo onde ele não havia chegado, por malefícios  de um capitão comunista. Sendo preparado é pouco: o menino fazia exercícios físicos diariamente sob a direção do pai, aprendeu artes marciais, lutava box e, lá pelos 12 anos aprendeu a atirar.

Independentemente disto, era um bom aluno, tendo ótimas notas em matemárica. E não havia amortecedor para a vontade férrea do pai: a mãe morrera quando ele tinha 05 anos e a avó, que a substituiu na criação, era totalmente subserviente ao pai dele.

Aos 17 anos, pensou em enfrentar o pai e tentar alguma faculdade, Engenharia talvez, mas a avó convenceu-o a, pelos menos, aguardar o chamado para o serviço militar – com o bom currículo escolar, quem sabe ele não era selecionado para o CPOR!

Aguardou, então, garantindo-se que quando e se desse baixa, pensaria no que fazer como civil. Para desgosto e profunda desilusão do pai, ele não serviu. No exame físico, constataram um pequena deficiência numa válvula cardíaca… e não quiseram arriscar a vida do jovem.

O pai tornou-se taciturno e distante dele, como se ele fosse culpado pela dispensa. E ele aproveitou para entrar numa faculdade, tornando-se contabilista, sendo contratado por uma empresa estatal que tinha sucursal na capital.

Tinha uma namorada desde os tempos do ginásio, ficou noivo e foi assumir o emprego. Um ano de sacrifício – Belo Horizonte/Juiz de Fora/Belo Horizonte – aproveitou as primeiras férias e casou-se com Maria Antônia, filha do dono de um restaurante frequentado por militares.

A formação militarizada que lhe foi imposta pelo pai,  mais o gosto e bom desempenho escolar em matemática, fizeram-no um excelente profissional, trabalhador assíduo, pontual e interessado, numa dedicação que o levou, em pouco tempo, a galgar postos na sucursal, até assumir a Gerência de Contabilidade. Profissional-mente, a vida lhe sorria!

A tristeza ficava por conta da vida em casa: como macho alpha, consciente de suas qualidades masculinas, ele ansiava por um filho, mas Maria Antônia ainda não conseguira engravidar. Hector tinha certeza que acabaria com a mágoa de seu pai se pudesse lhe dar um neto. Apostava até que o pai se mudaria pra Belo Horizonte só pra poder cria-lo com o mesmo entusiasmo e dedicação que Hector fora criado. Maria Antônia fizera exames e mais exames e, fisicamente, não havia problema algum.

A coisa era psicológica certamente, já que Hector, constantemente presente na cama com a mulher, tinha absoluta certeza que as deficiências eram dela, e nunca imaginou ou cogitou de que problemas podiam haver com ele. Aí, foi convencido por um colega de trabalho a procurar a igreja. E passou, junto com Maria Antônia, a frequentar um templo pentecostal, “Jesus, Teu Nome é Minha Luz”.

Filhos não vieram, mas ele não se incomodou muito. Seu pai morrera de infarto e Maria Antônia se apegou demais às prédicas pastorais, reduzindo consideravelmente as travessuras sexuais: ela começara a achar, certamente convencida pelo pastor, que filhos não vinham por causa do prazer que os dois sentiam com as travessuras sob os lençóis. Castigo de Deus, sem dúvida.

Ele não concordava muito com isto não, mas com Deus não se discute. Nem com o pastor… E dedicou-se ainda mais ao trabalho. E Deus, então, abençoou-o por algo, para ele, tão importante quanto um filho: na sua infinita sabedoria, deu-lhe um novo caminho para trilhar. Itamar Franco, um juiz-forano assumiu a presidência da República e indicou para a empresa em que Hector trabalhava, um militar contemporâneo de seu pai e frequentador assíduo do restaurante do pai de Maria Antônia. (continua amanhã)

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