Alienação ou calhordice? (III)

Eu vivo escrevendo isto aqui: o Brasil tem memória curta, o povo porque não recebe educação suficiente para se conscientizar e exigir mais (ficando a mercê dos pastores de Deus espertos e bem falantes), e a elite porque não tem interesse de ficar lembrando coisas que possam prejudicá-la. Há um médico e nutrólogo brasileiro, “paraíba” do Recife, chamado Josué de Castro, que escreveu, entre muitas outros, dois livros fundamentais para o conhecimento do Brasil: Geografia da Fome, de 1946, e Geopolítica da Fome, de 1951 (duvido que o Mito ou o Moro  tenham lido ou sequer saibam quem foi ele).

Naquela época (muitas autoridades brasileiras e mundiais ainda afirmam isto hoje, claro que por conveniência), se acreditava que a fome e a miséria no mundo eram resultantes do excesso populacional e da escassez de recursos naturais. Josué de Castro provou que fome e miséria eram consequências da má distribuição das riquezas, que cada vez mais estavam sendo concentradas nas mãos de cada vez menos pessoas. Ou seja, a razão daquele movimento Occupy Wall Street contra o 1% mais rico, que empolgou a  juventude americana há uns oito anos, já era preconizada por um nordestino porreta há 60 anos atrás!

Os governos brasileiros nunca reconheceram esta realidade. Sempre deram ênfase maior ao aumento da produção agrícola, distribuindo subsídios e prorrogando dívidas dos latifundiários (meu avô era um mestre na arte de engambelar o Banco do Brasil) – sem mexer no controle da natalidade, para não brigar com a Igreja. Quando vim trabalhar em Brasília, em meados dos anos 70, numa empresa do Ministério da Agricultura, participei diretamente da  política de abastecimento dos então governos militares – que não era diferente dos governos civis anteriores.

O Ministério da Agricultura tinha empresas públicas e autarquias que, no conjunto, respondiam pela produção agropecuária e pelo abastecimento alimentar do país: além do controle das terras (INCRA), da pesca (SUDEPE), do cacau (CEPLAC) e do meio ambiente (IBDF), o governo estabelecia preços mínimos de aquisição de produtos in natura – arroz, milho, trigo, soja, feijão, batata, carne, pescados (CFP) – e formava estoques em armazéns da minha empresa (CIBRAZEM), a serem recolocados no mercado em épocas de escassez ou quando houvesse necessidade de regular preços. E tinha outra empresa (COBAL), para cuidar do varejo alimentar.

Quando havia tragédias climáticas ou humanas (seca, enchentes, desabamento de morros, incêndios florestais…), cabia à COBAL fornecer cestas básicas para a população afetada… E só!

Enfim… cesta básica sempre foi a forma dos governos brasileiros atacarem a fome e a miséria nacional! Ou seja, dando uma esmola, que alivia a consciência e abre as portas do céu para autoridades públicas! O governo Lula mudou este paradigma… mas a elite não aceita isto! E o povão, inculto e passivo, não se revolta! Deus, efetivamente, nunca foi brasileiro!

O Diabo sim… sempre rondou estas paragens e, agora, sentou praça definitivamente no Planalto. Um presidente que diz num dia, sorridente e desafiante, que trabalhar com 9, 10 anos não atrapalha a vida de ninguém, e, no outro, que passar fome no Brasil é uma grande mentira, vive passeando de mãos dadas com ele no Palácio…

 

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