Nas cidades, o paulatino mas eficiente processo destrutivo seguiu roteiro mais sofisticado: a redução de recursos e da qualidade no ensino público em contraposição à abertura de espaço e garantia de crescimento/faturamento do ensino privado. Prédios sem manutenção ou em condições precárias, equipamentos defasados ou inexistentes, professores mal remunerados e com muita carga burocrática para depois das aulas de um lado e, do outro, complexos educacionais sofisticados, equipamentos de última geração, professores modernosos e inventivos, com duas obrigações exclusivas: dar aulas e conquistar alunos e pais.
Resultado inevitável: a classe média se bandeou para as escolas particulares, abandonando as públicas, relegadas, nas grandes cidades, às periferias, favelas e comunidades pobres, menos politizadas e mais passivas, reduzindo obviamente as preocupações e o interesse do poder público, por falta de cobranças, exigências e representatividade dos beneficiários, pais e alunos.
Claro que a maioria das pequenas cidades do interior continua sendo atendida por escolas públicas (normalmente, municípios pequenos não tem muita gente com renda suficiente para bancar escola privada), mas até nelas há diferenças brutais entre as urbanas e as rurais.
Num contexto destes, ser bem educado e estar cultural e politicamente alfabetizado, quem há de? Talvez 20% da população… aquela parcela que ganha entre 10 e 20 salários mínimos (a chamada Classe B do IBGE) e a parte superior da chamada Classe C (entre 04 e 10 SM) que pode, às vezes com sacrifício, despender 600 a 900 reais/mês para sustentar o ensino pago de um, dois ou três filhos! Eu disse 20%? Esqueçam!
Ficou famosa uma Pirâmide de Renda elaborada e publicada pelo DataFolha em 2013 (os dados ficaram piores depois, tanto que a Pirâmide não foi mais usada). Nela, 66% de brasileiros tinham renda mensal até R$2.034,00, 16% até R$3.390,00 e 14% até R$13.560,00… Ou seja, infeliz e inapelavelmente, apenas a parcela superior destes 14% , uns 6 a 7% que têm renda familiar superior a R$7/8 mil reais conseguem pagar as mensalidades cobradas pelos colégios privados do país. Além do 1% que ganha acima de R$13.560,00, 02/0,3% dos quais, inclusive, manda os filhos para estudar no Exterior! (E depois voltam para implementar políticas públicas sem conexão com a realidade brasileira…!).
Num país como o nosso, descoberto pela civilização europeia há 519 anos e governado há 519 anos por sua elite (cultural e economicamente falando, Getúlio, Jango e até Dilma faziam parte desta elite; só Lula se formou com o povão mas, mesmo beneficiando-o e ampliando sua participação na sociedade, aliou-se à elite, mantendo seus benefícios e privilégios, para conseguir governar), políticas educacionais são moscas no cocô do cavalo do bandido…
Aqui onde moro, uma área rural há 30 km do centro de Brasília, com uma população residente em torno de 2,5 mil famílias, há um único centro de ensino fundamental, onde crianças de 06 até jovens de 18 anos se misturam para receberem aulas, sem falar nos adultos que tentam aprender alguma coisa no horário noturno, após um dia de trabalho pesado nas chácaras… (os filhos dos ‘donos’ das chácaras, obviamente, estudam em colégios particulares no centro da capital).
Durante algum tempo, um diretor da Escola tentou mudar paradigmas e, junto com a associação, as igrejas e a comunidade, ensinar jovens a serem cidadãos. Com muito pouco apoio dos governantes em sua luta, acabou sendo assassinado em casa, aqui mesmo, por traficantes, incomodados com sua batalha diária contra as drogas na Escola.
Sua herança: a Assembleia Distrital deu seu nome à escola, que passou a ser chamada de Centro de Ensino Carlos Mota, a comunidade fez uma bela homenagem a ele, mas a escola se intermurou… fechou-se em si mesma, igualando-se a tantas e tantas outras escolas públicas por este país adentro. Ali é um lugar de aulas, apenas… Ali se ensina 2 + 2 = 4, estou, estás, está, Brasília é a capital do Brasil, Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil em 1500… Cidadania, democracia, direitos humanos, responsabilidade social é coisa de comunista!
Democracia é o governo do povo… Que povo?
