Política do bolso (II)

Como eu disse, Brasília é carente de indústrias. Sua economia depende do Orçamento Federal (há um Fundo Constitucional que banca Segurança, Educação e Saúde), e, em termos privados, da área de serviços e de empreiteiras e construtoras, as grandes pagadoras de impostos e, por cima ou por baixo dos panos, financiadoras das campanhas eleitorais.

Os governos conservadores criaram condições especialíssimas para estes últimos, implantando ‘cidades satélites’ por todos os lados de Brasília e abrindo novos bairros para as classes média e alta no entorno do Plano Piloto (Águas Claras, Sudoeste e Noroeste, por exemplos). Bem como propiciaram (junto com os poderes federais) uma abertura e rápida expansão para as empresas de prestação de serviços terceirizados, em sua maioria  pertencente a políticos distritais ou federais.

Para as classes menos abonadas, as novas cidades implantadas (Samambaia, Recanto das Emas, Santa Maria, São Sebastião, Estrutural, por exemplos), com distribuição gratuita de lotes, impulsionou exponencialmente o fluxo migratório das regiões pobres de todo o país para Brasília, aumentando o contingente de votantes do Distrito Federal e, claro, o poder eleitoral do rorizismo.

No caso dos servidores distritais, a grande jogada foi associar a terceirização dos serviços menos qualificados (limpeza, vigilância, recepção…) ao aproveitamento dos servidores destas áreas em atividades de escritório, mesmo que boa parte deles não tivesse qualquer qualificação para exercer funções burocráticas. Para exemplificar: uma gari foi aproveitada na portaria de uma Administração Regional, mas não ficou, pois não sabia digitar números para liberar a catraca; foi encostada numa sessão e se aposentou ganhando R$4.500,00 mensais.

Fato é que hoje os salários do funcionalismo da capital (servidores do GDF e da Câmara Distrital) são superiores à média nacional, ou seja, 97,4% deles ganham acima de 02 salários mínimos (74% dos funcionários da Câmara ganham mais de R$ 10 mil). Outra estatística incontestável, consequência natural deste populismo político (neste caso, de direita e de esquerda): em Brasília, funcionários estatutários representam 38,45% do total dos habitantes.

E há um complemento neste quadro que potencializa o poder do funcionalismo sobre Brasília: o alto escalão do funcionalismo federal também vive (alguns temporariamente apenas) e faz questão de mostrar o poder que tem sobre a cidade. Executivo, Legislativo e Judiciário empregam 282 mil pessoas, que recebem metade de todo o dinheiro pago em salários da cidade, apesar de representarem 22% da mão de obra aqui empregada.

Isto explica, sem contestação, outro dos meus incômodos com Brasília: por quê a direita consegue vitórias massacrantes na cidade? Em 2018, Bolsonaro teve 58,37% dos votos, contra  16,60% de Ciro Gomes e 11,87% de Haddad. Ou seja, a soma da esquerda não derrotaria a direita… Como já havia sido em 2014, quando a mais votada foi Marina Silva, dissidente da esquerda. (termina amanhã)

 

 

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