Do jeito que o diabo quer (VIII/X)

De volta ao Inferno e ao Festim Diabólico

Capítulo 8 – Quem é que está em toda parte?

– O primeiro Coliseu surgiu na entrada do Sambó… ou seria Orgiódromo? Duas esculturais louras inteiramente nuas e com imensos peitos traziam o estandarte onde se lia: “Trump’s First: I shit in your head”. Logo atrás desta Comissão de Frente, entraram 04 filas de  WASP’s de túnica branca, carregando a cabeça de um negro ou latino na mão direita e o capuz branco da Ku Klux Klan na esquerda, marchando o famoso passo de ganso nazista, as botas batendo uníssonas no solo, único som que eu ouvi. Quando os primeiros 04 chegaram em frente ao “ meu” camarote, o barulho das botas cessou e um coro de vozes infantis entoou: We are the Word… Olhei pra meu anfitrião, que sorriu: – Ironia e deboche são armas muito poderosas!

As crianças, negras ou latinas, vinham cantando e puxando um carro alegórico. Em cima, um boneco gigante de Donald Trump, pelado, sentado numa imensa privada, que só distingui o que era quando se aproximou um pouco mais: o globo terrestre. Num palanque acima da cabine do caminhão, Trump ou, melhor, pensei alto, um diabo transmudado em Trump fazia sinais obscenos para as arquibancadas.

– Não é um diabo, é o próprio. Quer dizer, é um Mensageiro de Lúcifer que incorporou no Donald e ocupa o lugar dele na Terra. Depois de incorporado, o ser humano fica flutuando num limbo até meu Mensageiro cumprir sua missão. Meu Mensageiro é o verdadeiro Donald Trump. Está entendendo o que eu disse sobre verdadeiros sentido e objetivo do Inferno? Em certo sentido, nós governamos a Terra, por mais que padres e pastores digam que seu amigo é o Senhor da Terra… O que explica porque você acha que vocês vivem no verdadeiro inferno…

– Eu não engulo esta… Nós, homens e mulheres, governamos a Terra! Mal e porcamente, reconheço… mas é o povo de cada país que elege ou impõe ou aceita seus governantes. E, para estes povos, seu inimigo lá de cima é muito mais poderoso que você. Se não achasse isto, você não estaria me contratando para glamurizar o seu Inferno, já que as almas preferem o Céu, não é mesmo?

-Lembra-se do que eu te disse? Que um não existe sem o outro! Você sabe perfeitamente como o ser humano, no geral, é estúpido e violento… Meus mensageiros apenas controlam o instinto natural do ser humano. Ou equilibram a balança com o lá de cima. Do mesmo jeito que seus anjos invocando a paz, a solidariedade, a igualdade, o amor…  quando um mensageiro meu se incorpora num jihadista ou num supremacista branco, ele faz o que? Uma tragédia! Explode um mercado num balneário francês ou metralha um show numa praça americana.

– E daí?… como disse um Mito sobre as mortes da pandemia…

-Quantas almas inocentes ou venialmente culpadas, exalando paz e solidariedade e cheias de  amor pra dar se fodem e vão parar no Grande Vestíbulo? Almas que, mais dia, menos dia, vão ceifar os campos do Senhor, não é mesmo? Claro, algumas acabam aqui comigo, mas só porque não tiveram aquele espaço para o arrependimento antes. Se dependesse só de vocês, humanos, o abastecimento de almas para o Céu e o Inferno  teria secado logo apos a bomba de Hiroshima. Todas já teriam virado poeira radiativa, sem qualquer serventia.

Enquanto conversávamos, os carros alegóricos do primeiro Coliseu passavam: todos eram puxados por bandos de almas (ou seriam humanos incorporados por mensageiros?). Um dos carros era no formato de um muro alto onde se agarravam latinos tentando escalá-lo. Quando estavam chegando no topo, apareciam figuras brancas e louras e baixavam o chicote até o latino cair e, de imediato, começar a escalar de novo.                Outro carro trazia o famoso touro de Wall Street com dezenas de figuras vestidas caracteristicamente com roupas de seus países de origem se matando pra ver quem conseguia chupar ou, pelo menos, passar os dedos nas bolas do touro, enquanto o Tio Sam, montado nele, gritava Aiôôô, Silver, e chicoteava, sem piedade,  todos que o conseguiam, que fugiam e se escondiam por um tempo, mas logo voltavam ansiosos pra se agarrarem às bolas, recebendo novas chicotadas.

Aí, houve uma pausa no desfile, quando fiz menção de me servir de outro uísque. O garçom se apresentou e me serviu enquanto, sob silêncio absoluto, o que me pareceu uma mulher totalmente vestida com um uniforme de campo de concentração nazista, empurrando um painel, veio andando solitária pela passarela. Quando ficou em frente ao camarote e deu pra ler o painel: “welcome to the promised land in Israeli”, ela abriu o roupão e se explodiu. Me encolhi todo na poltrona, enquanto meu anfitrião se levantava e aplaudia com entusiasmo.

Imediatamente, soou uma música tradicional judia e um carro alegórico puxado por dezenas de palestinos adentrou a avenida. Dois lança mísseis de curto alcance Jericho se posicionavam sobre a larga carroceria, sendo manejados por belas soldadas israelenses. Foi um espetáculo pirotécnico digno da passagem de ano em Copacabana: cada vez que a música solfejava Shalom Alechem (A paz sobre vós), um dos lança mísseis era acionado e um dos puxadores do carro explodia, espalhando estrelas e cachoeiras de fogo coloridas pra todos os lados. (continua quarta-feira)

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