Os bolsonários (I)

Durante anos, a associação da qual faço parte na região rural  onde moro, brigou, pacifica e legalmente, pela melhoria da principal via de acesso à região. A DF—001, via de contorno de Brasília, é, praticamente, a única via de acesso à minha casa, separando uma área habitada hoje por umas 10 mil famílias de áreas de preservação ambiental, como o Parque Nacional de Brasília e a Reserva Biológica da Contagem.

A DF-001, que limita as duas áreas, foi asfaltada há muitos e muitos anos atrás, e as operações ‘tapa-buraco’ não resolviam mais a precariedade de sua pista. A ‘briga’ pelo recapeamento da pista começou no segundo governo Roriz e só teve uma luz no governo Agnelo, que lançou a licitação, mas não teve tempo de iniciar as obras, o que aconteceu no governo seguinte, em duas etapas, do balão do Colorado até a Rua 09 e desta até a DF-170.

Durante os muitos anos de pista ruim, moradores, visitantes e carretas e caminhões que trafegavam por esta pista (cortando caminho e evitando posto policial, do Nordeste para o Norte, e vice versa), por suas condições, faziam-no em velocidade baixa, com riscos menores para pedestres e bicicleteiros, uma característica da região.. Recapeada a pista, transformaram o acesso ao Lago Oeste em pista de corrida de etapas: um rali até  o quebra-molas em frente à Associação e outro rali após a Rua 09.

O Governo, então, interviu: o DER-DF, concordando com a direção do Parque Nacional de Brasília, irredutível na proteção de animais que costumam atravessar a pista, determinou uma velocidade máxima de 60 km/h para a pista (não aceitando a argumentação da Associação, que queria 80 km/h) e implantou mais quebra-molas (nos trechos de passagem de animais entre as áreas de preservação ambiental) e ‘pardais’ eletrônicos em trechos onde a vontade de acelerar dos motoristas é maior. A velocidade na pista diminuiu imediatamente.

Mas não ligaram todos os pardais, apenas um. E, em pouco tempo, as redes insociais divulgaram isto e a alta velocidade voltou a imperar. Os quebra molas limitavam alguns trechos, mas não toda a pista. Mesmo assim, muitos usuários de chácaras e moradores da região não gostaram. Criaram até um grupo “Anti quebra molas”, que propôs abaixo-assinados, contratação de advogado, manifestações contra a volúpia do governo em ‘arrecadar dinheiro às custas dos pobres cidadãos”.

Independentemente dos governos que nos governam, existe uma política de trânsito que segue normas técnicas mundialmente aceitas. Pardais eletrônicos geram multas, é evidente, que só podem ser cobradas se existirem… Ou seja: se você excede o limite de uma via ‘pardalizada’, você vai ter que pagar uma multa… Se você não quer que o governo se beneficie desta “indústria das multas”, basta você obedecer a sinalização…

Qualquer pessoa tem todo o direito de protestar… O limite de 60 km para a pista do Lago Oeste é ridículo? Talvez seja. Mas foi imposto porque muitos usuários e moradores de chácaras abusavam da velocidade, 120, 140 km/h, enquanto percorriam a DF-01 a partir  do balão do Colorado ou vice versa, a partir da DF-170. Não havia riscos apenas para as pessoas que transitavam pelo acostamento da rodovia, mas para quem estava esperando ônibus nas paradas ou quem estava pedalando ou obedecendo o limite de velocidade estabelecido.

Não há como falar em ‘indústria de multas’ quando as pessoas obedecem a sinalização estabelecida para uma via… Se não há transgressão, não há multa a ser cobrada. Quebra-molas, ‘pardais’, redutores de velocidade preservam vidas! São chatos, limitam nosso desejo de correr, ganhar tempo? Sim… mas também reduzem os riscos de atropelarmos pessoas (ou animais, no caso de uma área de preservação ambiental), de causarmos a morte de alguém, de sofrermos acidentes… 60 km/h de velocidade no Lago Oeste talvez seja muito limitante, mas foi o que foi estabelecido! Quem obedece, não contribui para a chamada indústria da multa… quem não obedece, arrisca contribuir para a indústria da morte!

Infelizmente, a conjuntura política não ajuda a compreensão das pessoas. O ódio instilado numa classe média já propensa ao facciosismo, que dispõe de uma rede insocial onde os cachorros podem ser soltos, sem o perigo da represália, destila estupidez e falta de respeito total, seja pela lei, seja pela vida humana. Ninguém quer  diálogo, ninguém quer entendimento. O sinal está fechado para a democracia… (continua)

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