Ódio a Lula (I)

Uma coisa que sempre me encucou: por que a classe media, conforme se depreende de conversas e redes sociais,  detesta Lula? A elite brasileira não gostar dele e tudo fazer para que ele não seja presidente outra vez, apesar do tanto de dinheiro que ganhou entre 2002 e 2010, é compreensível… ela sempre foi e sempre será predadora! Quanto menos gente participar da riqueza nacional, melhor. Mais gente precisando de empregos… Mais gente disputando vagas de trabalho… Menos exigências trabalhistas… Mais lucro em cima dos trabalhadores e não em cima da produção e da produtividade…! (o que exigiria trabalhar duro, botar a mão na massa, que não é o seu forte! Mandar é mais estiloso!) A classe alta, por sua vez, tem a pretensão de um dia se tornar elite e, por isso, segue esta cegamente. Mas, e a classe média?

Eu me considero um típico cara de classe média. Filho de médico que dedicou a vida à profissão e não aos negócios, me formei em Jornalismo pela faculdade federal de Minas e, por uma contingência da vida – Silvestre, um colega de Faculdade que estava em Brasília e sabia das minhas “prendas profissionais” me convidou – vim parar na capital, para conduzir a área de comunicação de uma empresa estatal, ainda no período ditatorial.

De uma hora para outra – casado, com uma filha e outra a caminho – saí de um salário de 1.500 cruzeiros por mês, como chefe de arte de uma editora/gráfica, em Belo Horizonte, para ganhar 8.000 cruzeiros como assessor de comunicação, em Brasília. De uma hora para outra, virei classe média altíssima (em maio de 1975, quando tomei posse, o salário mínimo valia Cr$532,80. Ou seja, saí de pouco mais de 03 para ganhar quase 16 salários mínimos…!)

Construí minha vida, então. Sem mudar o modo como eu via este mundo e, particularmente, o Brasil. Ao contrário, consolidei esta visão. Como assessor de comunicação de uma empresa cujas atividades envolviam o país inteiro, conheci o Brasil de cabo a rabo. O lado rico e o lado miserável… O lado bom e o lado ruim… O lado da abundância e o lado da carência…!

O que despertou esta dúvida, até hoje não respondida, que explica a pergunta inicial: por quê a classe média brasileira, em geral (há exceções, claro!) é tão mesquinha, vivendo agarrada ao próprio umbigo e só demonstrando solidariedade humana em datas propícias, Natal, Dia da Criança, por exemplos, ou quando as tevês anunciam  grandes tragédias inesperadas?

13/10/2015 – PORTO ALEGRE, RS, BRASIL – Famílias abrigadas das chuvas encontram auxílio e doação no Ginásio Tesourinha

Durante algum tempo, pensei que fosse uma decorrência natural da luta pela sobrevivência. Afinal de contas, nos anos 60/70, na classe média se enquadravam todos aqueles, profissionais liberais, pequenos comerciantes, micro industriais, trabalhadores individuais, que lutavam muito para sustentar a família e tentar dotá-la de alguns confortos que começavam a despertar o desejo de consumo, como a tevê a cores, o som estereofônico, uns dias em Copacabana e… meus deuses! um carro…!

Meu primeiro carro, um Fuscão 70, não era meu…  Foi comprado por meu pai quando eu estava na universidade. Foi com ele que vim para Brasília em 1975. E foi ele que vendi para completar a compra do meu primeiro carro mesmo, uma Brasília Vermelha.  Aí, minha primeira mulher passou num concurso do Banco Central, a renda familiar aumentou mais ainda e pudemos comprar, a longo prazo, minha primeira casa própria, um apartamento na 203 Norte.

Brasília sempre foi considerada uma ilha da fantasia, a cidade com maior renda per capita do país. Mesmo com o inchaço da cidade, depois da distribuição de lotes e criação de novas cidades satélites pelo populista governador Roriz, o que atraiu gente de todo o país, em busca de melhores oportunidades de vida, nem sempre encontradas, a alta renda do funcionalismo público – Legislativo e Judiciário inclusos – dava e dá à cidade um padrão de vida bem superior ao de todo o país.

Nesta ilha da fantasia eu sobrevivo ainda hoje. A renda baixou bastante porque aposentado, mesmo previdente como eu, que, na época das vacas gordas, buscou uma previdência privada para complementar o benefício do INSS, não consegue manter o mesmo padrão de vida dos tempos produtivos.

Ou seja, em mais de 40 anos de Brasília, meu círculo de amizades e conhecimentos englobou e engloba basicamente gente de classe média média e alta, grande parte dela anti petista, sendo que alguns fazem questão de demonstrar absoluto ódio a Lula. Em uma ou outra reunião social ou naqueles grupinhos que se formam após as assembleias da associação de produtores da minha região, eu costumo levantar, muito mais para sacanear do que para discutir ou rebater alguma coisa, a situação do país ou, simplesmente, a provável condenação de Lula na 2ª instância da Justiça.

Sorte minha que eu consigo vestir minha capa de profissional do Jornalismo e só encaminho as discussões inevitavelmente acaloradas, mesmo sendo quase todos anti lulistas: inapelavelmente,  há os que acham que Lula deveria ser condenado e preso, há os que acham que ele deveria ser condenado e execrado publicamente e há, até, os que acham que ele deveria ser preso e enforcado, mesmo não havendo pena de morte no Brasil.

Ás vezes, aparece alguém mais moderado, que também acha que Lula é culpado, mas que gostaria que a Justiça fosse menos partidária, como tem sido contra ele, exatamente para que não passasse, para boa parte da população, principalmente da classe baixa, esta sensação de que ele está sendo implacavelmente perseguido pelos ricos… Pobre debatedor!  Se não são meus apelos de paz e concórdia, seria crucificado na hora!

Ou seja, é ódio puro, descontrolado, inexplicável, se considerarmos a tão decantada cordialidade brasileira. É óbvio que do outro lado, também tem muita gente que odeia quem odeia Lula… Assim como tem gente que reconhece a importância dele e, de forma amorosa, canta isto publicamente. (continua)

 

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