Criando minha narrativa

Minha filha, que mora em Washington, responde a um texto que lhe mandei sobre a situação do Brasil e a manipulação da grande imprensa, com o post de uma amiga dela, via Facebook. Diz o post: “Para quem não gosta de ser manipulado, vale lembrar que algumas coisas a mídia não consegue fazer. Ela não pode mudar as estatísticas do desemprego nem a taxa de inflação. Nem inventar o tamanho do buraco da Petrobras. Ou esconder os números do desastre fiscal e do recente aumento da desigualdade. Não consegue tirar Marcos Valério, os empreiteiros e o Santana da cadeia. E não pode regravar palavras pronunciadas ao vivo pelos políticos. Use os números e a informação gravada e crie sua própria narrativa.

Concordo com ela e, felizmente, ela e milhares de pessoas hoje dispõem de blogues e redes sociais para criarem suas próprias narrativas. Até  15, 20 anos atrás, a grande imprensa reinava sozinha no mercado de opinião e, por isso, fazia e derrubava presidentes e governos, subia e descia as bolsas, fazia o dólar cair ou levantar e endeusava ou jogava na lama pessoas,   manipulando informações, distorcendo imagens, noticiando os fatos de acordo, exclusivamente, com seus próprios interesses.

Isto não mudou. Com menos credibilidade hoje, mas com a mesma desfaçatez e impunidade. Só que, como a gente dispõe, agora, de canais para manifestar nossas próprias opiniões, podemos debater sem intermediários e, por isso, peço licença para a amiga de minha filha para complementar seu post:

a grande imprensa não pode mudar a situação, mas ela pode piorar, e muito, esta situação. Ela pode dar ênfase total apenas ao lado negativo da economia, fazendo com que o ânimo dos empresários se torne mais conservador ainda – segurando investimentos e demitindo empregados – e o dos consumidores mais precavido – comprando menos – o que piora, ainda mais, o quadro econômico.  Ela pode tornar o buraco da Petrobras, uma gigante com ações no mercado internacional, mais profundo ainda, bastando colocar na primeira página uma manchete com a “possibilidade” de investidores estrangeiros processarem a empresa, e “escondendo” no rodapé da página 04 que a Petrobras bateu novo recorde de produção no pré sal.

estadão - petrobrasok

A grande imprensa pode alardear os números desastrosos da situação fiscal atual, não comparando com os dados relativos aos números de 12 a 15 anos atrás, quando eram muito piores. Ela pode dar manchete colossal sobre o crescimento da desigualdade, desconsiderando o fato de que este crescimento de 2015 em relação a 2014, foi bem pequeno, se comparado com a redução significativa desta desigualdade havida nos últimos 12 anos. Ela não consegue tirar os citados da cadeia, mas ela não diz que operadores  e empreiteiras agem do mesmo modo e com a mesma desenvoltura desde os tempos de JK e da construção de Brasília ou que o mensalão do PT levou operadores e políticos para a cadeia, mas o mensalão do PSDB continua sendo empurrado com a barriga pela Justiça de Minas. E não pode, efetivamente, regravar palavras pronunciadas ao vivo, mas pode editar textos, falas, imagens e vídeos  de modo a levar o leitor ou o telespectador a entender o oposto do fato acontecido realmente.

TV Globo 1                             TV Globo 2

Felizmente, este poder está se desmilinguindo aos poucos. Breve, muito breve, jornais e revistas impressas serão tão inúteis quanto máquinas datilográficas… e emissoras de rádio e televisão tão inexpressivas quanto máquinas fotográficas. Os barões da mídia continuarão barões, claro, mas de outros feudos, conseguidos enquanto ainda mandavam e desmandavam nos poderes da República.

 

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